quinta-feira, 17 de junho de 2010
Tio do Rock
Das minhas excursões dentro da casa do meu avô, várias peças e objetos antigos mexiam com a minha imaginação. No quarto ao fundo na parte de cima da casa ficava o antigo quarto da Bisa que pra mim era uma figura somente do imaginário.
A velha cômoda de estilo antigo com um vaso grande e uma bacia de porcelana que se usava para lavar o rosto nos velhos tempos.
No mesmo quarto uma cadeira de balanço que a brincadeira de sempre era balançar tanto até ela começar a levantar os pés. Lógico que a brincadeira terminava sempre com a cadeira virada pra frente e eu lá em baixo dela torcendo para que ninguém subisse a escada.
Ainda no quarto uma pequena cristaleira utilizada pelo meu avô para guardar alguns livros. Era chaveada, dizia-se que tinha alguns escritos que não eram para crianças isso do tempo que meu pai era uma das crianças da casa.
E assim a cada ida na casa da Vó eu percorria aqueles mesmos caminhos.
Os brinquedos que habitavam aquela casa eram antigos.
O velho jogo de varetas, um banco imobiliário do tempo que a moeda nem era o cruzeiro, e claro o velho resta um.
Mas o que me chama neste texto não são propriamente estes brinquedos e minhas artes pela casa, mas sim a visita à garagem da casa.
Naquele espaço que já era ocupado pelo meu tio mais novo Aldo Jung (o da foto acima) encontravam-se vários recortes de jornal colado pelas paredes. Fotos de mulheres instigantes e de outras figuras que não recordo agora.
O que mais me impressionava era levantar a cortina que tapava as prateleiras e apreciar as peças da bateria que meu tio tocava.
Do tempo que descobri as tais peças meu tio não tocava tanto pelo menos não naquela bateria. Se não me engano as peças eram verdes peroladas como a bateria que aparece na foto preto e branco.
Era uma coisa lúdica, um brinquedo que não era um brinquedo e sim um instrumento de verdade.
Interessante, Bateria e Fuca têm disso.
São de verdade.
Feitos pra gente grande, mas ainda assim desperta o emocional.
Olhava as peças, passava a mão.
Fechava a cortina e deixava tudo como estava.
Meu tio é essa figura da foto.
Um sujeito que só vê o tempo envelhecer. Ele não.
Mantém sempre este espírito renovado de quem faz coisas que fogem ao seu tempo.
Exemplo disso é que ele continua tocando bateria.
Melhor que isso tocando Rock.
E dos bons tempos. Aliás, isso é a única coisa que ele conserva do passado.
O velho e bom Rock.
Na época em que ser cabeludo era bater de frente com os conceitos da sociedade, lá estava ele para desgosto do meu avô.
Um avô bem diferente destes que se vê em filmes.
Figura de poucas palavras, sempre com uma fisionomia de poucos amigos. Um molho de chaves gigante na cintura como se o mundo fosse um lugar de abrir e fechar a todo o momento.
Mas isso é assim já me disseram que se vê a idade de uma pessoa pelo número de chaves que carrega na cintura.
Em uma visita a casa do meu tio quando do seu primeiro casamento, me encantava ver um quarto onde tinha na pintura do teto o céu. Aquilo era mais do que diferente pra mim que jamais imaginava que nas paredes e no teto de uma casa poderia se ter algo a mais que uma simples tinta branca. Sempre foi o cara dos desenhos, das caricaturas,
dos audiovisuais. Certa vez desmanchou o seu estúdio de áudio e me deu toda a forração acústica. Enfiei dentro da velha Kombi do seu Léo e trouxe pra casa. Na parte dos fundos montei um pequeno estúdio. E ali já com a minha bateria tocava durante toda a noite ao som dos discos de viníl que encontrasse dentro de casa.
Era um exercício e tanto que o melhor de tudo:
A vizinhança não ouvia.
Claro que não poderia tocar outro instrumento se não esse. Depois de tanto namorar na garagem a velha bateria, descobri que este instrumento ninguém precisava me dizer nada pra tocar. Era dar uma nota e sair atrás.
Isso devia estar escrito com certeza na minha história de vida.
Engraçado que nunca tive muito contato com meu tio. Nunca fomos de grandes aproximações familiares, churrascos, festas estas coisas.
Cada um na sua e claro eu era o filho mais novo.
O tempo foi passando e vejam só do tempo que eu excursionava pela grande casa da Rua 16 de julho, adotei a bateria como o meu instrumento.
Assim como o meu tio do Rock.
Do tempo que ele não tocava mais, quem tocava era eu.
Deste tempo que ele toca, eu não tenho mais tocado.
A balança se equilibra na família.
Dois tocando haveria de ser muito barulho.
A verdade é que destes anos que se passaram ainda continuo com o mesmo sentimento da bateria nas prateleiras da garagem.
Do tempo que meu tio era cabeludo não preciso me lembrar muito porque ele ainda continua o mesmo cara.
Só vê o tempo envelhecer e claro, dentro do seu espírito jovem, nunca deixa o Rock morrer.
OBS: Naquela garagem além de habitar os sonhos de criança também saiu o meu primeiro fusca, um 79 zero quilômetro que meu avô comprou, mas já não dirigia tanto naquela época. Para não se estragar na garagem meu Pai o levou pra casa que de lá nunca mais voltou. Sorte minha!
O Fuca é este aí a baixo com uma das tantas baterias que ele carregou.
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Putz, guri! Sempre me surpreendes e me emocionas com tuas recordações e teu belo texto para contá-las aos outros. Ainda mais sendo protagonista deles!
ResponderExcluirObrigado pela homenagem!
Abração!
Que fim levou esse fusca branco???
ResponderExcluirwww.oldersbahnvolks.blogspot.com
Só quem tem um tio do Rock pode contar estas histórias, Abração batera!
ResponderExcluirComo sempre "belo texto"!Me deu saudades daquele tempo...Jacque Jung
ResponderExcluirPois é Maurizio isot foi uma burrada que eu fiz, na chance de ter um carro com mais espaço porque a familia crescia coloquei ele no negócio. Coisa de guri, hoje não faria mais isso. De qualquer forma o fusca 79 branco teve tudo que era de direito, catraca para rebaixar, aro 14, dois P44 na traseira e dois F560 perfil baixo na frente. Som, conta giros. Por onde anda? Gostaria de saber.
ResponderExcluirOlha só. Apesar de, naqueles idos sábados a tarde, estar junto com o Tio do Rock, ensaiando para as noites de shows que se antevinham, não lembro do sobrinho do Tio do Rock.
ResponderExcluirEste texto é quase uma Ode a um tempo que não volta mais, mas é também uma homenagem mais do que merecida ao Aldinho, amigão (ao seu modo)de todas as horas.
Concordo que para ele é o tempo que envelhece.
Lendo sobre o passado, ao qual também pertenci, fica a saudade mas fica também a alegria de ver todos os demais tios do rock por ai, lépidos e faceiros, mantendo a alegria da (boa) música viva em nossos corações.
Parabéns Aldinho e parabéns a todos que de alguma forma despertaram sonhos e fantasias nos "sobrinhos do rock".
Adorei as recordações da tua infância, continue postando essas maravilhas.... Bj
ResponderExcluirHoje assisto, com o "tiozinho do rock", o tempo envelhecer e aprendo todos os dias a ser feliz com ele, com muita música, é claro!
ResponderExcluirParabéns pelo belo texto.
Abraço.
Mas entao com roda 14 e catracas e os outros acessorios, era fuca de boy da época!!! Showwww, queria ter visto!!!!
ResponderExcluirwww.oldersbahnvolks.blogspot.com
Bota boy nisso, ainda tinha um dispositivo que criei para ligar os faroletes e tocar a buzina sem precisar tirar a mão da palanca. Na verdade não perdi muito a mania de ficar inventado coisas.
ResponderExcluirTaí o Macfuca, rsrsrsrsrs.
Abração!
Obrigado Clara pelo elogio. Na verdade o culpado da inspiração e o mestre das baquetas!
ResponderExcluirAbraço!
Cara (ou caro filho),já não me surpreendes mais com teus textos,seja os que contam tuas lembranças,seja os sobre outros assuntos. Esse aí me trouxe de volta,mais do que a garagem,a livreira em que o meu pai e teu avô guardava seus livros,muitos dos quais de leitura proibida para menores... Eu sabia,porém,onde ele guardava a chave. E lia os que me interessavam. Quanto ao Tio do Rock,era infernal o barulho que o conjunto produzia nos ensaios dos sábados à tarde. Ainda bem que,naquele tempo,eu não fazia sesta depois do almoço.
ResponderExcluirAqui em casa quem desistiu da sesta era o seu Juvenal e a dona Risoleta, na papel de padrinhos, nunca falavam nada só perguntavam se era dia de batuque! E que batuque, rsrsrsrsr.
ResponderExcluirBeijo
Querido...que maravilha! eu sempre soube que essa família (da qual um dia fiz parte) era pra lá de talentosa...queria acrescentar que, quando conheci o vô e suas chaves e seu armário de livros, eu fazia Biblioteconomia e ele acalentava a esperança de que eu, um dia, organizasse aqueles livros... e, mais, com relação ao céu, tenho pra te dizer que sonhamos muito sob aquelas estrelas...beijos, saudades e sucesso! Maria do Rocio
ResponderExcluirVê só tanto tempo e aquele céu ainda faz parte de nossa história.
ResponderExcluirUm beijo e obrigado.
Amigo MAcFuca, estou emocionado começando chorar rsrsrsrs.. que história bonita e cheia de detalhes...aí que eu vejo que não podia ter escolhido parceiro melhor para ser colaborador no meu blog, um Fusqueiro Roqueiro assim como eu hahahahaa
ResponderExcluirParabéns pela postagem!
Abraço
Henrique/Fusca do Rock
Viu só Rock quem disse que roqueiro não chora.
ResponderExcluirAbração meu amigo.
Bela, linda, demais essa crônica/relato. Confesso que me identifiquei, e muito.
ResponderExcluirParabéns pelo texto. Obrigado pela leitura
Obrigado Rafa, ainda mais vindo de você que é o mestre dos textos bem escritos.
ResponderExcluirAbração
Parabéns. Belíssimo texto. Tanto que chegou a me dar um nó na garganta ao ler. Viajei no tempo em um segundo. Participei do "barulho" na garagem como um dos integrantes do conjunto e essas lembranças me fazem muito bem, e muito mal, ao mesmo tempo, pois sei que esse tempo mágico não volta mais. Merecida a homenagem ao "Tio do Rock". O cara sabe tudo sobre bateria. Ainda tocamos juntos eventualmente, e quanto mais passa o tempo, melhor ele toca.
ResponderExcluirUm abraço e parabéns.
Fala Buffalo, na verdade estas coisas também me fazem bem e me fazem mal. É praticamente impossível isso não acontecer quando relembramos boas histórias da nossa vida. Por isso que é preciso que se faça as coisas na vida no tempo certo de fazê-las. Ser criança, ser adolescente e ficar adulto. Perde-se uma etapa e ficariamos tristes de lembrar que naquela época não tivemos nenhuma história pra lembrar.
ResponderExcluirSorte nossa que essa lembrança boa podemos ter.
Abração
Belo texto para belos tempos...
ResponderExcluirComo irmã do Buffalo, do alto dos meus 13 anos adorava assistir aos ensaios naquela garagem. Ia de ônibus com minha amiga Eneida, feliz e orgulhosa por vivenciar aqueles momentos e por poder contar para as colegas do Sévigné que meu irmão fazia parte de um "conjunto".
Quanto ao Tio do Rock, uma sempre doce criatura, realmente ele dá um baile no tempo. Aldinho sempre se renovando e o tempo se preocupando apenas em passar. Lembro que o Aldo foi o primeiro homem que vi com os cabelos cortados em camadas. Quando ele chegou lá em casa com a melena toda "picotada", abalou as estruturas do prédio. Velhos tempos, belos dias...
Um abraço.
Suzana (Dudy)