domingo, 27 de abril de 2014

Abotoaduras da Alma


Sou o tipo de cara que gosta de abotoaduras.
Não que o meu orçamento acompanhe o dos que normalmente usam, mas por uma questão de gosto pessoal e detalhe estético.
Sempre acreditei que todo o homem feito tem a chance de se esconder atrás de um bom terno e uma boa gravata.

Minha salvação é o Carpinejar fazendo propaganda de moda masculina.
Tô me sentindo.

Mas o que me trás a estas linhas não são os requintes pessoais.
Talvez por de trás das abotoaduras esteja um cara que procura constantemente colocar tudo sempre em seu lugar.
Ou aparentar um possível controle que internamente nunca achou.

Ontem cheguei em casa antes de todos, um pouco mais cedo que o normal.
Subo as escadas e encontro as coisas fora do lugar.
Sobre minha cama as cobertas retorcidas da mesma forma quando sai da cama pela manhã.
No quarto do meu filho cobertas, livros, trabalhos e controles remotos misturados aos lençóis e cobertor.
As portas do armário abertas, em cima do teclado algumas peças de roupas espalhadas com a cara de que sofreram na aula de educação física.
No quarto da minha filha nada diferente.
A cama desfeita e sobre a escrivaninha algumas folhas que ela recorta e outras tantas onde ela desenha o que a vida lhe deu capacidade de fazer.
Pela sala os mesmos chinelos espalhados da mesma forma como estavam um pouco antes de eu ir deitar.
Antes mesmo de tirar a gravata comecei a colocar tudo no seu devido lugar.
Começando pelo meu quarto.
Depois entrei no quarto ao lado que é do meu filho, fecho as portas do armário aéreo antes que a minha testa as feche.
Fui arrumando pouco a pouco as coisas.
Ao mesmo tempo em que organizava a casa me dava conta que em casa arrumada demais a vida não acontece.
Todo mundo levanta, faz o que precisa e sai.
Corre-se o dia todo.
Normalmente a rotina não é o que se gostaria de estar fazendo.
Faz parte.
Fiquei pensando ao passo em que esticava as cobertas como é triste não contar com a bagunça que a vida nos proporciona.
Como será triste o dia em que os quartos dos meus filhos estiverem tão organizados que eu não mais os reconheça.
A gente cansa.
Sim a gente cansa de muita coisa idiota que vida nos apresenta, o problema é que precisamos dividir o que é trabalho do que é vida em família.

Colocada a bagunça em ordem terminei de tirar a gravata que até então só tinha afrouxado o nó.
Abri os botões da camisa e retirei as abotoaduras.

Não demora a porta bate e a turma começa a chegar.
Vozes ocupam o vazio do corredor, as mochilas, bolsas e casacos ficam pelos cantos e a casa retoma a sua forma natural.

Sim, a bagunça da casa é “As abotoaduras da alma”.

2 comentários:

  1. Belo testo, como sempre !
    Mas só quem não te conhece pra acreditar que correstes o risco de bater com a testa nas portas aéreas do guarda roupa do Fernando ! hahaha.
    Márcio.

    ResponderExcluir
  2. Excelente! É o que achei do teu texto. Impossível deixa-lo sem um comentário.

    ResponderExcluir